A hepatite é a inflamação do fígado.

Pode ser causada por vírus, uso de alguns remédios, álcool e outras drogas, além de doenças autoimunes, metabólicas e genéticas.

São doenças silenciosas e nem sempre apresentam sintomas.

Quando aparecem podem ser cansaço, febre, mal-estar, tontura, enjoo, vômitos, dor abdominal, pele e olhos amarelados, urina escura e fezes claras.

No Brasil, as hepatites virais mais comuns são as causadas pelos vírus A, B e C.

Existem, ainda, os vírus D e E, esse último mais frequente na África e na Ásia.

Milhões de pessoas no Brasil são portadoras dos vírus B ou C e não sabem.

Elas correm o risco de as doenças evoluírem (tornarem-se crônicas) e causarem danos mais graves ao fígado como cirrose e câncer.

Por isso, é importante ir ao médico regularmente e fazer os exames de rotina que detectam a hepatite.

Hepatite viral

As hepatites virais são causadas por cinco vírus:

  • o vírus da hepatite A (HAV, do inglês hepatitis A virus),
  • o vírus da hepatite B (HBV, do inglês hepatitis B virus),
  • o vírus da hepatite C (HCV, do inglês hepatitis C virus),
  • o vírus da hepatite D (HDV, do inglês hepatitis D virus) e
  • o vírus da hepatite E (HEV, do inglês hepatitis E virus).

A doença tem um amplo quadro clínico, que varia desde formas assintomáticas até a insuficiência hepática aguda grave (fulminante).

A maioria das hepatites virais agudas é assintomática, independentemente do tipo de vírus.

A hepatite crônica, em geral, cursa de forma assintomática.

As manifestações clínicas aparecem quando a doença está em estágio avançado, com relato de fadiga, ou, ainda, cirrose.

O diagnóstico inclui a realização de exames em ambiente laboratorial e testes rápidos, a fim de caracterizar a doença e sua gravidade.

Vamos conhecer o que são as hepatites virais.

Diferenças entre a hepatite A, B e C

Hepatite A

Causada pelo vírus A (HAV) é também conhecida como “hepatite infecciosa”, “hepatite epidêmica”, ou “hepatite de período de incubação curto”.

O agente etiológico é um pequeno vírus RNA, membro da família Picornaviridae.

A principal via de contágio do HAV é a fecal-oral, por contato inter-humano ou por meio de água e alimentos contaminados.

Contribuem para a transmissão a estabilidade do HAV no meio ambiente e a grande quantidade de vírus presente nas fezes dos indivíduos infectados.

A transmissão parenteral é rara, mas pode ocorrer se o doador estiver na fase de viremia do período de incubação.

A disseminação está relacionada com a precariedade da infraestrutura de saneamento básico e condições de higiene praticadas.

Na maioria dos casos, a hepatite A é autolimitada e de caráter benigno, sendo que a insuficiência hepática aguda grave ocorre em menos de 1% dos casos.

Esse percentual é maior em pacientes idosos.

Pessoas que já tiveram hepatite A apresentam imunidade para tal doença, mas permanecem susceptíveis às outras hepatites virais.

O que acontece quando somos infectados pelo vírus da hepatite A

Por causa da sua capacidade de resistir ao pH ácido, o HAV passa pelo estômago, replicando-se no trato digestivo.

Atravessa o epitélio intestinal, chegando às vias mesentéricas e ao fígado pelo sistema porta.

O vírus se replica no hepatócito e é excretado pelos canais biliares, atingindo o intestino por meio da bile, onde, finalmente, é eliminado nas fezes.

 Apesar da possibilidade de existência de replicação extra-hepática, a patologia relacionada à infecção está praticamente restrita ao fígado.

A infecção por HAV, tradicionalmente, é dividida em duas fases.

A primeira consiste na fase não citopática, durante a qual a replicação viral ocorre exclusivamente no citoplasma do hepatócito.

A segunda fase corresponde à citopática, apresentando infiltração portal e zonal, necrose e erosão da placa limitante.

Dano hepatocelular e destruição não são resultados de um efeito citopático direto do HAV, mas um processo mediado pela resposta imune do hospedeiro.

Uma resposta imunológica excessiva, refletida por uma redução acentuada do RNA viral durante a infecção aguda, está associada com hepatite aguda e, eventualmente, com a forma fulminante.

Como nosso corpo reage

As respostas imunes humorais e celulares costumam manifestar-se pouco antes da elevação das transaminases.

A imunoglobulina da classe IgM anti-HAV pode ser detectada antes ou no momento de manifestação dos sintomas clínicos e declinam em cerca de três a seis meses, tornando-se indetectáveis pelos testes diagnósticos comerciais disponíveis.

A imunoglobulina da classe IgG anti-HAV surge logo após o aparecimento da IgM e pode persistir indefinidamente, conferindo imunidade ao indivíduo.

Dessa forma, na fase aguda de infecção, são encontradas ambas IgM e IgG. Em indivíduos previamente infectados, encontra-se somente a IgG.

Os anticorpos neutralizantes representam o principal mecanismo de proteção contra o vírus.

São normalmente direcionados contra proteínas de superfície, em especial as proteínas de capsídeo VP1 e VP3.

A detecção de anticorpos que reconhecem as proteínas não estruturais da região P2 permite diferenciar infecção (presença desse anticorpo) de vacinação (ausência desse anticorpo) como fontes de determinantes antigênicos

Hepatite B

Causada pelo vírus da hepatite B (HBV), conhecida anteriormente como soro-homóloga.

O agente etiológico é um vírus DNA, hepatovírus da família Hepadnaviridae.

Pode se apresentar como infecção assintomática ou sintomática.

A transmissão do HBV se faz por via parenteral e, sobretudo, pela via sexual.

Dessa forma, o HBV pode ser transmitido por solução de continuidade (pele e mucosa), relações sexuais desprotegidas e por via parenteral (compartilhamento de agulhas e seringas, tatuagens, piercings, procedimentos odontológicos ou cirúrgicos, etc.).

Outros líquidos orgânicos, como sêmen, secreção vaginal e leite materno podem igualmente conter o vírus e constituir fontes de infecção.

A transmissão vertical (de mãe para filho) também é causa frequente de disseminação do HBV em regiões de alta endemicidade.

Uma particularidade dessa infecção viral crônica é a possibilidade de evolução para câncer hepático, independentemente da ocorrência de cirrose.

O que acontece quando somos infectados pelo vírus da hepatite B

O HBV é capaz de infectar, primariamente, células hepáticas.

Os receptores de membrana usados pelo vírus ainda não estão completamente elucidados.

O vírus diferente do da hepatite A, replica DNA.

A hepatite B pode se apresentar de forma aguda ou crônica nos indivíduos infectados.

Hepatite aguda

As hepatites agudas benignas costumam ser identificadas pelo aumento dos níveis séricos das aminotransferases.

O que leva o indivíduo a apresentar sintomas de uma infecção viral inespecífica, com leves alterações gastrintestinais.

Após essa fase inicial, pode ocorrer a forma ictérica da doença, ou seja, a cor amarelada.

Seguida de uma fase de convalescença, com melhora progressiva do quadro clínico do indivíduo.

Hepatite crônica

O HBV estabelece infecções crônicas, primariamente, por transmissão vertical de mães infectadas para o neonato, que ainda não possui um sistema imune totalmente desenvolvido.

A infecção do feto pelo HBV é dependente do estado imune e da carga viral da mãe, fatores que podem permitir ao vírus atravessar a barreira placentária.

Situações que levam à mistura do sangue da mãe e do feto também possibilitam a infecção.

A infecção crônica é definida pela presença persistente do HBsAg no soro de um indivíduo por um período de seis meses ou mais.

Como durante o percurso da infecção podem ocorrer integrações de parte do genoma do HBV ao genoma do hospedeiro, é possível haver indivíduos com HBsAg circulante, mesmo com replicação viral mínima ou inexistente no fígado.

A infecção pelo HBV em pacientes que não apresentam o antígeno de superfície do vírus da hepatite B (HBsAg) detectável é denominada de infecção oculta (IOBG).

De forma geral, a infecção crônica pelo HBV pode ser dividida em quatro fases:

  • Imunotolerância

Ocorre elevada replicação viral, com tolerância do sistema imune e sem evidência de agressão hepatocelular (transaminases normais ou próximas do normal).

  • Imunorreação

Com o esgotamento da tolerância imunológica, ocorre agressão aos hepatócitos, nos quais ocorre a replicação viral, gerando elevação das transaminases.

  • Portador inativo

Essa fase é caracterizada por níveis baixos ou indetectáveis de replicação viral, com normalização das transaminases e, habitualmente, soroconversão para anti-HBe.

O escape viral pode ocorrer por integração do DNA viral ao genoma das células hospedeiras ou mediante escape viral por depressão da atividade imunológica do hospedeiro, seja por meio de mutações virais, seja por tratar-se de pacientes imunodeprimidos.

  • Reativação

Em seguida à fase do portador inativo, pode ocorrer reativação viral, com retorno da replicação.

Como nosso corpo reage

A infecção pelo HBV pode ser espontaneamente curada (desaparecimento viral) antes do desenvolvimento de uma resposta imune humoral.

O papel da resposta imune inata na resolução da infecção pelo HBV ainda não está totalmente elucidado.

A IgM anti-HBc é um marcador do início da infecção, enquanto que anticorpos específicos para o HBeAg e para o HBsAg indicam uma resolução favorável para a infecção.

Os anticorpos anti-HBs são neutralizantes e capazes de mediar imunidade preventiva, sendo induzidos pela vacinação.

Os anticorpos anti-HBc e anti-HBs persistem por longos períodos no indivíduo, sendo que o anticorpo anti-HBs confere proteção contra o vírus.

Hepatite C

Causada pelo vírus HCV, conhecido anteriormente por “hepatite Não A Não B”.

Sua transmissão ocorre, principalmente, por via parenteral.

É importante ressaltar que, em um percentual significativo de casos, não é possível identificar a via de infecção.

População de risco

São consideradas populações de risco acrescido para a infecção pelo HCV por via parenteral:

  • indivíduos que receberam transfusão de sangue e/ou hemoderivados antes de 1993;
  • pessoas que fazem uso de drogas injetáveis (cocaína, anabolizantes e complexos vitamínicos),
  • inaláveis (cocaína) ou pipadas (crack), e que compartilham os equipamentos de uso;
  • pessoas com tatuagem, piercings ou
  • que apresentem outras formas de exposição percutânea (por exemplo, consultórios odontológicos, clínicas de podologia, salões de beleza, etc., que não obedecem às normas de biossegurança).

A transmissão sexual é pouco frequente – menos de 1% em parceiros estáveis – e ocorre, principalmente, em pessoas com múltiplos parceiros e com prática sexual de risco (sem uso de preservativo).

É importante destacar que a infecção pelo HCV já é a maior responsável por cirrose e transplante hepático no mundo ocidental.

Quando há sintomas, o quadro clínico é semelhante àquele decorrente de outros agentes que causam hepatites virais e o diagnóstico diferencial somente é possível com a realização de testes para detecção de anticorpos específicos, antígenos virais ou material genético.

A persistência da infecção do HCV pode estar relacionada à grande variabilidade genética do vírus, que permitiria o escape do sistema imune.

Pacientes infectados por transfusão sanguínea evoluiriam mais frequentemente para as formas crônicas da doença do que aqueles infectados por outras vias.

A infecção crônica se desenvolve em anos ou décadas.

Acredita-se que a evolução para cirrose e carcinoma hepatocelular (HCC, do inglês hepatocellular carcinoma) dependa de fatores como carga viral e genótipo, mas ainda há discussão sobre o assunto.

O dano celular causado pelo HCV é pequeno.

Por isso, acredita-se que o dano hepático ocorre, primariamente, por ação de mecanismos imunológicos

Como nosso corpo reage

O HCV é capaz de induzir uma forte resposta imune inata, uma vez que a infecção causa a ativação de genes de resposta ao interferon.

No entanto, o vírus é capaz de resistir aos seus efeitos e ainda assim estabelecer infecções crônicas.

Pacientes capazes de se recuperar espontaneamente da infecção pelo HCV são os que estabelecem respostas imunes fortes, que podem ser prontamente detectadas no sangue.

Ainda não foi possível associar esses anticorpos a algum tipo de imunidade protetora, embora existam estudos indicando que os pacientes que se recuperam da infecção podem ser resistentes a novas exposições ao vírus.

Hepatites D e E

Hepatite D

Menos comuns aqui no Brasil, a hepatite D é causada pelo HDV.

O HDV é um vírus defectivo, satélite do HBV, que precisa do HBsAg para realizar sua infecção.

Isso significa que,  pessoas que já tiveram a hepatite B são mais propensas a contrair hepatite D.

A infecção delta crônica é a principal causa de cirrose hepática em crianças e adultos jovens em áreas endêmicas na Itália, na Inglaterra e na região amazônica do Brasil.

Devido à sua dependência funcional em relação ao HBV, o vírus delta tem mecanismos de transmissão idênticos aos do HBV.

Os portadores crônicos inativos do vírus B são reservatórios importantes para a disseminação do vírus da hepatite delta em áreas de alta endemicidade de infecção pelo HBV.

A resposta imune na hepatite D ainda não foi totalmente compreendida.

Hepatite E

O HEV é um vírus de transmissão fecal-oral.

Essa via de transmissão favorece a disseminação da infecção nos países em desenvolvimento, nos quais a contaminação dos reservatórios de água mantém a cadeia de transmissão da doença.

A transmissão interpessoal não é comum.

A doença é autolimitada e pode apresentar formas clínicas graves, principalmente em gestantes.

Essa forma de hepatite viral é mais comum em países na Ásia e África, principalmente na Índia.

A maioria dos casos de hepatite E aguda é silenciosa e se resolve rapidamente.

A detecção da imunoglobulina da classe IgM anti-HEV ocorre no período inicial da fase aguda de infecção, nas primeiras duas semanas após o início dos sintomas, podendo persistir até cinco meses.

A imunoglobulina da classe IgG anti-HEV surge imediatamente após o aparecimento da IgM e persiste por períodos mais longos.

Os anticorpos neutralizantes representam o principal mecanismo de proteção contra o vírus e são, normalmente, direcionados contra proteínas do capsídeo viral, em especial da região codificada pelo ORF2.

Como prevenir as hepatites

A hepatite A pode ser prevenida pela utilização da vacina específica contra o vírus A1.

Entretanto, a melhor estratégia de prevenção desta hepatite inclui a melhoria das condições de vida, com adequação do saneamento básico e das medidas educacionais de higiene.

A hepatite B é uma doença imunoprevenível.

A vacina é altamente eficiente e é disponibilizada pelo governo brasileiro em seus serviços de saúde, fazendo parte do calendário de vacinações infantis.

Outras formas de prevenção da infecção são a adoção de práticas sexuais seguras com o uso de preservativo.

E o não compartilhamento objetos de uso pessoal, como lâminas de barbear e depilar, escovas de dente, material de manicure e pedicure, equipamentos para uso de drogas, confecção de tatuagem e colocação de piercings.

Para a hepatite E a vacinação está indicada para indivíduos suscetíveis, inclusive aqueles com infecção anterior que apresentem ausência de manutenção de anticorpos IgG, pois a reinfecção pode ocorrer.

Cabe ressaltar que a vacina nesse momento ainda não é recomendada pela OMS, e tem seu uso restrito à China.

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