Você já ouviu falar sobre quimeras?

Imagina que louco ter dois DNAs em um único ser.

Esse gatinho que ilustra nosso post é um exemplo disso, as chamadas quimeras!

Não está entendendo nada?

Calma que a gente explica!

Vamos entender tudo sobre esse tema que parece ficção científica, mas é genética!

O termo “quimera” tem sua origem na mitologia.

Como nome de um imponente e horripilante monstro que expelia fogo pela boca e pelas narinas.

E que tinha a parte anterior de seu corpo era uma combinação de leão e cabra e a parte posterior, a de um dragão (BULFINCH, 2014).

A quimera causava grandes estragos na região de Lícia e deveria ser destruída por um herói.

O que levou o rei do país a procurar alguém que fosse capaz de cumprir com a tarefa.

Coube a um jovem guerreiro, de nome Belerofonte, a missão de destruir o monstro, contando, para isso, com a ajuda do cavalo Pégaso.

Assim, montado no cavalo, Belerofonte elevou-se nos ares, derrotando a quimera com facilidade.

Mas o que a quimera da mitologia tem a ver com os seres com dois DNAs na realidade?

Durante anos a figura da quimera habitou apenas o mundo antigo.

Mas então o que é uma quimera?

A medicina atribuiu o termo “quimerismo” para caracterizar indivíduos que possuem dois tipos distintos de DNA em seus corpos.

Trata-se de um fenômeno raríssimo.

As quimeras humanas surgem de maneira natural ou de maneira artificial, por meio de intervenções médicas ou científicas.

Quando a quimera é natural, o indivíduo pode passar anos ou até a vida inteira sem ter conhecimento da anomalia.

O primeiro caso documentado de quimera humana foi publicado no British Medical Journal, em 1953.

O caso envolvia uma mulher britânica, que supostamente apresentava diferentes tipos sanguíneos.

E por isso, os resultados dos exames da britânica apontavam que ela possuía os tipos sanguíneos O e A.

Acreditando tratar-se de um fenômeno impossível, a clínica inglesa onde a mulher havia realizado o exame repetiu o procedimento, de maneira a descartar possíveis erros resultantes da análise da amostra original.

Entretanto, o novo resultado confirmou o antigo: a mulher possuía dois tipos sanguíneos, O e A. (GRANZEN, 2014).

Foi então que o médico responsável pelo laboratório se lembrou de um estudo sobre casos de gêmeos que apresentavam sangue misto, resultante da gestação.

Sendo assim, o médico perguntou à paciente se ela tinha algum irmão gêmeo, fato que foi confirmado por ela.

Que além isso, informou também que o irmão gêmeo falecera meses após o nascimento, o que confirmaria a suspeita inicial do médico.

Um novo exame foi realizado, desta vez utilizando-se da saliva da paciente, que confirmou o sangue O.

Com isso, os médicos concluíram que a paciente possuía originalmente o sangue O.

Mas que também tinha sangue tipo A, do seu irmão gêmeo.

E por isso, foi considerada a primeira quimera humana.

Você deve estar se perguntando, mas como as quimeras humanas são formadas?

Gêmeos podem der ter dois DNAs?

Então vamos entender melhor!

O quimerismo humano natural ocorre antes do nascimento.

E o grau de variação do DNA pode diferir de quimera para quimera.

Ou seja, não é sempre um mesmo padrão.

Assim, as quimeras naturais podem ocorrer de três maneiras:

  • microquimerismo (ou fetomaternal microchimerism),

  • quimerismo partenogenético e

  • quimerismo tetragamético.

Há, ainda, quimerismos não embrionários (tecnicamente são casos de microquimerismos).

Que são ocasionados por doação de órgãos ou transfusões sanguíneas.

Microquimerismo

O microquimerismo, ou fetomaternal microchimerism (FMC) é o tipo mais comum de quimerismo humano.

O termo quimerismo é utilizado quando um indivíduo contém populações de células derivadas de diferentes indivíduos (células não próprias).

Já quando há baixos níveis destas células, utiliza-se o termo microquimerismo. (BARCELLOS; ANDRADE, 2004).

Assim, durante o curso de uma gestação normal há um tráfego bidirecional entre mãe e feto.

Ou seja, as células do feto passam para a circulação materna, rotineiramente.

Essas células fetais são normalmente encontradas no sangue periférico materno no primeiro trimestre da gravidez.

Já detectadas a partir de cinco semanas de gestação.

Mas ao longo da gravidez há um aumento progressivo da carga de DNA fetal, que se torna mais evidente na época do parto.

Há casos, contudo, em que tais células permanecem no organismo materno durante décadas após a gravidez.

As células transferidas podem alojar-se no novo corpo tanto na circulação sanguínea, quanto como parte de tecidos.

Assim,  o microquimerismo fetal é a extensão de células fetais microquiméricas à mãe.

Já a persistência de células maternas nos filhos é conhecida por microquimerismo materno (QUIRÓS ALPÍZER,  2009).

E o mais curioso!

Embora o atual percentual de gravidezes microquimerismo seja desconhecido, especula-se que pode ocorrer em praticamente toda gravidez.

Quimerismo partenogenético

Uma quimera partenogenética é formada quando um ovo que não sofreu meiose é fertilizado por dois espermatozoides.

Nesse caso, os dois espermatozoides fornecem o dobro da dosagem do material genético do pai.

E assim emparelha com o dobro do material genético da mãe, resultando em uma quimera.

É um tipo raríssimo de quimerismo, tendo sido registrado apenas uma vez (SVENDSEN; EBERT, 2008).

Quimerismo tetragamético

No quimerismo tetragamético dois ovos são fecundados por dois espermatozoides.

O que resulta em dois embriões distintos que se fundem para formar uma única pessoa.

Seria o caso de uma gravidez que originalmente resultaria em gêmeos.

Os tecidos das quimeras tetragaméticas são compostos por células do embrião original e do outro embrião, que foi absorvido pelo primeiro. (SVENDSEN; EBERT, 2008).

quimeras

Outros tipos de quimerismo

Além dos casos de quimerismo embrionários, existem outros tipos de quimerismos não embrionários.

Chamados de quimerismo artificial ou ainda de quimerismo adquirido.

Como por exemplo a possibilidade de surgimento de microquimerismo após a realização de transfusões sanguíneas ou doação de órgãos.

No caso da transfusão sanguínea, o microquimerismo é temporário não durando mais que 90 dias.

E acontece por meio da mistura de células, eritrócitos (glóbulos vermelhos), plaquetas e consequentemente o DNA presente nos leucócitos (glóbulos brancos) de ambos os envolvidos.

Já no caso de transplante de medula óssea ou de outro órgão, os leucócitos novos, em sua maioria, possuirão o DNA do doador, tornando o receptor, portanto, uma quimera.

Já que no corpo do receptor serão encontradas células com suas características genéticas originais e também os novos glóbulos brancos contendo no seu núcleo DNA do doador.

Diagnóstico

A quimera humana pode passar anos, ou até toda a vida, sem saber da sua condição genética.

Com isso, o diagnóstico das quimeras torna-se difícil.

Como essa condição, em sua regularidade, não apresenta sinais fenotípicos, exceto em algumas raras situações.

E, bem como, em se tratando de quimerismo tetragamético de espécie hermafrodita, a sua tipagem passa também despercebida pelo hospedeiros e médicos.

Em especial nos casos em que a quimera possui um segundo DNA em apenas um órgão, a exemplificar o de reprodução, podendo transmitir a herança genética à sua eventual prole.

Por não estar no sangue, a evidenciação é de alta complexidade, partindo-se da premissa que cada quimera é única quanto aos lugares de distribuição de genomas diferentes.

Nesta hipótese, a descoberta só se realizará a menos que seja retirada uma amostra de DNA do órgão específico e encaminhado para análise

Mas há, em alguns casos raros, sinais físicos, que incluem pele com coloração desigual ou olhos com cores distintas (SVENDSEN & EBERT, 2008).